sexta-feira, 29 de junho de 2007

De passagem

Tenho visto que não conheço o sertão, mas sei quem ele é. Cresci a vida contada pelos outros, das coisas da seca. Sabendo que lá a terra se racha e se abre e engole as miseresas todas do mundo.
- Arreda o pé da tua cama e bota ele no chão, que é pra sentir a dureza da vida, menina!
O sertão me mostra um amontoado de gente desgraçada e feliz pedindo a compaixão de Deus pra que caia do céu uma nuvenzinha.
É bonito assim mesmo, com toda a sua feiúra.

segunda-feira, 25 de junho de 2007

As coisas (ou eu mesma).

Minha casa contém fitas de cetim que servem para filtrar. Enquanto balançam suavemente no meio do caminho, passam por elas o sim e o não. As coisas todas têm uma função, não em si, mas com relação ao todo. Há ainda espaços vazios, objetos guardados. O tempo, porém, sabiamente pede para que se façam presentes somente em seus devidos momentos presentes.
Sinto a dor desses espaços vazios, às vezes sinto-a em forma de lágrimas insistentes em que mergulho minha face. Faço parte da casa e carrego o que está nela. A lua lá fora vai vigiando tudo e, alguma vez, empresta sua claridade para alumiar.
Está prestes a se tornar um sol, a se deparar com aquilo que tentou dividir e não pôde.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

Dos desencontros

-Escova logo esses dentes pra vir olhar a lua, menina!
Mas ela tinha a noite toda pra fazer isso. Tava igualzinho a um sorriso amarelo e gordo suspenso no céu, a cara dela no espelho também.
Até que a lua foi embora e a menina dormiu.

quarta-feira, 20 de junho de 2007


Quarta-feira

Gosto de café.
Cheiro de galinha depenada.
Água do mar,
salgada, pelada.
Caldo de feijão,
tarde boa,
dia gostoso...
Dia vermelho.

terça-feira, 19 de junho de 2007


Os sabores

Casa. Flor. Terra.
Elementos de mim
com forma forte e leve.
De suavidade de cheiros,
cores, formas, sexos.
Representam na vida
o que é de mulher.
De beleza que só
entende quem sente.
É a sutileza mais
bruta e humana vivível.
É o que sou.

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Das coisas

Começo a arrumar a minha casa e penso cautelosamente nas possibilidades que há em cada pedacinho dela. É bem quente, aconchegante. Lá encontro o que não mais falta em mim. Um sonho me contou que para renovar as energias dentro e fora, é preciso que se troque o lixo todos os dias. É preciso cuidar também dos restos que não nos servem.
Observo tudo com cuidado para fazer o que é preciso. Aos poucos, a casa clareia. A casa e a vida. A casa e o dia. A casa e o eu. O vento passa de leve pela janela.

Dos mesmos

Começo a enfeitar minha casa e ela sorri. O que falta nela está em mim. As plantas esperam para serem postas em seus lugares. Não falta espaço para o oco de mim que está no mundo. Tenho em mãos meu corpo e a consciência mas não sei o que fazer com eles. Escuto devagar a melodia que me embala. E o cheiro da tarde vai penetrando em meu dia. É doce, é forte, é gostoso demais. Prefiro não me perder.

Os mesmos

Começo a construir minha casa e nela planto tudo o que é novo. Faço do que passei um universo de aprendizagem. Junto com os objetos, construo-me. Sinto-me bem perto de mim. Do alcance da minha beleza vivida. Não choro pois as lágrimas se cansaram. Sofro sem pranto e vivo até o onde vão as minhas forças.

Do nada

Começo a enfeitar minha casa. Aquela que não possuo. Construa-a aos poucos que é pra não errar o caminho. Em alguns lugares planto flores que talvez não se abram nenhuma. Moro onde habita meu corpo, onde estão os meus pés. Enquanto escrevo, transformo o vácuo em beleza de ser dita.
Começo a enfeitar minha casa e a ressucitar do meio da vida. O brilho do sol é de uma pureza fresca qual seu calor. As pessoas que moram debaixo dele não têm de descobrir e nem conhecer, têm de nascer. Nascer para a grama, para o pouco que nos resta de natureza fora dos quadros. E o que não deve se acabar nunca é mesmo essa vontade de ter uma dia aquilo que nos salvará do tédio de não ter. Um amor, um filho, uma casa ou até mesmo um desamor.
Prepare seu pensamento
A vida...O que é?
É estar sendo.
É nunca ser
pra aprender.
Que cada coisa
Não é em si
E basta.
É pra sempre,
E acaba.